sábado, 18 de maio de 2013

Um jovem chamado Bangarraju


Shivamma está descalça; seu sári é simples e seu corpo, esquelético. Sua casa foi construída dentro de um tubo de captação de água pluvial, descartado pela fábrica onde ela e o marido trabalham. A vizinhança, escondida num enorme pátio arborizado, é composta por canos imensos, perfilados como se fossem traillers. A família da Shivamma, composta por quatro pessoas, vive na Índia. Apesar de ela ser oriunda da casta dalit, sua vida melhorou depois que ela abraçou a fé cristã. Ela veio morar na vila de tubos como uma jovem noiva, buscando escapar da miséria de sua vila natal. Shivamma e seu marido ganham o equivalente a US$ 5 dólares (uns 8 reais) por dia. Por três anos, ela permaneceu estéril – até que um jovem cristão, chamado Bangarraju, veio à sua casa orar por ela: “Eu não sabia porque ele tinha vindo ou para quem ele orava”, lembra a mulher. “Pensei que Jesus fosse um dos deuses”. Ela concebeu, dando à luz a um filho e, depois, a uma segunda criança, uma menina. Quando sua filha tinha três meses de idade, ficou muito doente. Bangarraju veio, orou novamente, e a garota foi curada. “Dei-me conta de que Jesus era o Deus verdadeiro”, diz Shivamma. A conversão mudou a rotina da pobre família. “Costumávamos beber e todos os dias tínhamos brigas terríveis. Jesus Cristo trouxe paz à nossa casa. Não tenho mais medo porque conheço o verdadeiro Deus e confio nele”, declara.
É provável que Shivamma não tenha noção dissomas pessoas como ela são a cara da nova Índia cristã. Potência emergente e um dos principais pólos de atração de investimentos internacionais, o país, de mais de 1 bilhão dehabitantestem visto surgirem comunidades cristãs vibrantes e crescentesElas são parte de uma Igreja totalmente nacionalcontextualizada com a cultura local e fruto de evangelismo autóctone. A recém-criada Índia cristã é encontrada na camada mais baixa da sociedade, em meio a homens e mulheres como Shivamma,pobres e analfabetosEles pensam de uma forma inimaginável para seus ancestrais e muitos estão seguindo a Cristo, fato inédito na história do paísSer um dalit é muito pior do que ser pobre, pois não importa quanta educação ou patrimônio acumule, o indivíduo permanece impuroEles são cerca de 150 milhões de pessoas, e, como os leprosos bíblicosexceto pelo fato de que, conforme a cultura indiana dominante, não podem sercuradosContudo, muito embora descenda de gerações de pessoas acostumadas a se curvar e a resignar-se com a invisibilidade social, Shivamma não se humilha mais.
Bangarraju também é um dalit. Missionário e fundador de igrejas, ele começou a alcançar a vila dos tubos em 1996. Ensinava crianças analfabetas numa escola informal, que se reunia debaixo de uma árvore. Além disso, o obreiro organizava visitas médicas, com o apoio da missão que o sustenta, a Operação Mobilização. Durante o seu primeiro ano de visitas à vila, Bangarraju nada disse sobre Jesus. Agora, uma grande parcela da vila de tubos segue a Cristo. Com o passar dos anos, o missionário fez mais do que pregar o Evangelho: ele ensinou Shivamma e seu marido a disciplina necessária para economizar dinheiro. Como resultado, o casal conseguiu comprar uma casa em sua vila natal. Considerando o futuro próximo, Shivamma está feliz morando em seu tubo, sem ter de pagar aluguel. Ainda assim, ela tem sonhos maiores para seus filhos: a educação que nem ela ou seu marido receberam. Por isso, está decidida a fazer com que as crianças aprendam inglês e saiam da vila de tubos. “Não queremos que eles sofram como nós sofremos”, resume.
A igreja da Índia cresce de maneira vertiginosa. Hoje ,cerca de 70 milhões de indianos declaram-se evangélicos, segundo dados da missão Operação Mundial. Tal número, se verdadeiro, a colocaria entre as oito maiores populações cristãs do mundo, logo atrás de Filipinas e Nigéria, e maior do que em nações de forte tradição protestante, como Alemanha ou Reino Unido. Só que, diferentemente dos irmãos de  em outros países, os crentes da Índia vivem num contexto espiritual bem próprio e hostil – o panteão hindu tem quase 300 milhões de deuses e há grupos religiosos extremistas atuando no paísQuando fundamentalistas hindus venceram as eleições nacionais em 1998, trouxeram com eles um hinduísmo radical que fomentou perseguição aos cristãos e leis contrárias à conversão. O evangelismo público tornou-se praticamente impossível. Missionários indianos, então, deixaram as pregações e reuniões nas ruas, estabelecendo-se e em lugares específicos com o intuito de abrir escolas, oferecer desenvolvimento econômico e treinamento, bem como implantar igrejas domésticas. Dez anos depoisna região de Orissa, confrontos religiosos deixaram mais de mil cristãos mortos e aldeias inteiramente destruídas. Grupos radicais de orientação hinduísta, maoísta e muçulmana costumam perseguir as comunidades cristãs, muitas vezes com a complacência das autoridades.
Mesmo assim, oportunidades para espalhar as boas novas do Evangelho parecem estar em todo lugar. Outra organização missionária, a Operação Mundial contabiliza 2.223 grupos ainda não evangelizados na Índia, cinco vezes mais do que na China, a segunda nação menos alcançada do mundo. “Índia, Afeganistão e Paquistão formam a maior concentração da humanidade não alcançada do mundo”, afirma Jason Mandryk, ligado à entidade. Contudo, por toda a vasta nação, relatos sobre conversões a Cristo se sucedem. A Operação Mobilização, uma das maiores agências missionárias que atuam no país, cresceu a ponto de abranger 3 mil congregações, das quais trezentas surgiram na última década. Certo ministério, com base em um hospital no norte da Índia, testemunhou 8 mil batismos ao longo dos últimos cinco anos, após um longo período de poucos resultados na pregação. As detalhadas estatísticas da agência missionária mostram que a Igreja cristã está crescendo a uma taxa três vezes maior do que a população hindu da Índia.
“Isso é algo novo nos últimos dez anos, especialmente no norte da Índia”, avalia Todd Johnson, diretor do Centro para o Estudo do Cristianismo Global do Seminário Teológico Gordon-Conwell. Ele adota estatísticas mais modestas em relação à quantidade de cristãos no país. O Atlas do Cristianismo Global, editado pelo centro, estima que eles seriam perto de 60 milhões. A diferença, contudo, pode ser explicada pela metodologia de contagem. É que muita gente está frequentando comunidades religiosas independentes e outros, embora convertidos ao Evangelho, não revelam abertamente sua condição, devido ao temor de represálias e supressão de direitos familiares ou sociais.  O censo indiano de 2001 colocou os cristãos como representando um pouco mais do que 2% da população do país. Contudo, atualmente a Operação Mundial estima esse número próximo de 6%, e aponta que pesquisadores cristãos na Índia encontram resultados ainda maiores, alcançando nove por cento. “Inúmeros cristãos indianos dizem que portas fechadas por séculos estão se abrindo”, destaca Johnson.
Em uma nação com território de proporções continentais e habitada por centenas de grupos étnicos, é difícil ter certeza sobre essas tendências. As estatísticas sobre religião são poucas, e os relatórios de organizações missionárias podem refletir apenas condições locais. Mesmo assim, a mudança no panorama religioso na índia é perceptível. “Situações animadoras estão acontecendo. Isso é real”, comemora Johnson. “Nossa metodologia é esperar para ver e fazer nosso melhor para identificar esse movimento. Porém, o que está ocorrendo é notável. Todo mundo concorda com isso”. Mandryk lembra que os resultados mais notáveis são observados justamente na base da pirâmide social. “Todos sabem sobre o incrível reavivamento entre os dalits. Esse foi o maior crescimento nos últimos anos”, comenta. Contudo, a influência já se faz sentir em outros setores da sociedade.  “Agora, vemos sinais de crescimento entre as castas médias e entre aquelas pessoas com menos de 35 anos. Existe uma nova dinâmica em curso entre a geração urbana e educada, e também nas castas mais altas.”
Embora as taxas de crescimento da Igreja não tenham atingido o mesmo nível daquelas observadas na China, durante o pico das décadas de 1970 e 80, Mandryk acredita que ele pode ser acelerado.  “Está ocorrendo uma mudança de marcha e o movimento começa a ganhar velocidade. A diversidade de castas, regiões e contextos é um fator importante. O crescimento da igreja não está mais restrito aos miseráveis.”


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